quinta-feira, 9 de julho de 2015

Montage of Heck


Não sei se por coincidência, mas desde que assisti Montage os Heck (sim, mas é claro que eu já assisti) que me sinto muito muito mal, fisicamente mesmo.

Se você não é fã de Nirvana e de Kurt Cobain, que é algo além do que ser apenas fã do som da banda que mudou o cenário undergorund, mas que, vá lá, seja um indivíduo com algum grau de sensibilidade, é simplesmente impossível não ser afetado pelo documentário. É Kurt Cobain contando sua própria história, através de gravações, diários, anotações dispersas, filmagens caseiras, filmagens de bastidores. Courtney Love nua, de corpo e de alma. É Kurt sinceríssimo, autêntico, reforçando o mito do gênio atormentado. Isso tudo sem filtro algum. 

É um material que, pensando bem, não deveria ter vindo a público. Courtney Love admitindo que usou heroína durante a gravidez, não como a Vanity Fair publicou, mas que sim, usou no começo. A madrasta de Kurt, a típica madrasta megera, que desprezava o entiado. É difícil não ficar com raiva da madrasta que, apesar de relatar o quão visível era o desejo de Kurt em ter uma família, o colocou para fora de casa, e ri quando o próprio vocalista descreve sua primeira experiência com a maconha. O pai e a mãe, visivelmente arrependidos dos erros e do abandono, mas que nos enchem de revolta, porque não se abandona um filho. E eles abandonaram Kurt à própria sorte e aos vícios.

 Brett Morgen, criador do documentário bancado pela HBO, cria uma experiência única em que os depoimentos ajudam a entender e criar links, através das letras das músicas, o comportamento de Kurt, além de deixá-lo falar por si mesmo. Feito de forma cronológica, o filme mostra Kurt muito novinho, dando seus primeiros passos, apagando velas de aniversário, tocando um violão de brinquedo, como qualquer criança. 

Brett teve acesso irrestrito a todo o acervo da família: 200 horas de canções inéditas, áudio e filmes caseiros, caixas cheias de obras de arte e mais de 4.000 páginas de anotações e desenhos para analisar; o diretor levou oito anos para finalizar o longa. Montage of Heck ainda tem um amontoado de imagens de shows, notícias e entrevistas (as famosas entrevistas malucas) de TV, mas tudo isso faz mais sentido ao lado dos traços de personalidade artística, dos poemas incompletos e das listas que Kurt criava. Sim, ele fazia listas! Uma de suas listas: Entendo e respeito que a religião é importante para certas pessoas"... "Adoro meus pais, no entanto discordo de quase tudo que eles defendem" ... "Os teus pais têm medo de você" ... "Esterelização dos homofóbicos" ... As mulheres devem dominar o mundo". 

A parte do filme que mais mexeu comigo foi a parte da sua adolescência, feita em cartoon, uma das cenas inclusive ilustra este post. O começo de todas as suas experiências, na maioria muito dolorosas, como a própria solidão, por se sentir descartado (e humilhado) pelos pais, pela escola, pelos garotos que se ajustavam, e como tudo isso o fez se apegar a tudo que era desprezado e desajustado por injustiça. E eu comecei a entender mais ainda como a minha formação me fez tão aversa a preconceitos. Afinal, eu cresci com esse cara gritando nas entrelinhas (e às vezes nas próprias linhas) que o diferente é que é lindo.

 Montage of Heck é devastador. Hoje o mundo inteiro pode entrar, quase que literalmente, na vida de Kurt Cobain. E no próprio filme são várias as referências ao fato de que Kurt não suportava se sentir invadido ou humilhado. E daí a gente chega à conclusão de que Kurt odiaria Montage of a heck. Ao menos o Kurt de 1994.

Inté.

Nenhum comentário :

Postar um comentário

Sejam educados, seus lindos!

Related Posts Plugin for WordPress, Blogger...