quinta-feira, 26 de março de 2015

Memórias Póstumas de Brás Cubas



Como prometido, volto para começar as resenhas sobre os 100 livros essenciais da literatura brasileira e, começando com um dos meus livros favoritos da vida toda, dos autores favoritos da vida toda, Memórias Póstumas de Brás Cubas de Machado de Assis.

Vamos ao enredo.

 Antes de qualquer coisa a gente pode afirmar que Brás é um pulha, uma criaturinha parca, de mente médio burguesa, quase uma metáfora do rico inútil da burguesia brasileira (mas poderia ser um burguês de qualquer lugar e qualquer época). 

A infância de Brás Cubas, representante da sociedade patriarcal brasileira da época, é cheia de privilégios e caprichos patrocinados pelos pais. Tinha uma criança negra como brinquedinho, o Prudêncio, que era humilhado, servindo de cavalinho. O horror. A partir daí você já pega nojo no Brás Cubas (e aí já temos um elemento para desmentir quem acusa Machado de não falar contra a escravidão). Na escola, Brás era amigo de traquinagem de Quincas Borbas, que aparecerá no futuro (no livro homônimo Quincas Borba). Na juventude, as benesses ficam por conta dos gastos com a prostituta de luxo Marcela a quem Brás dedica a célebre frase: “Marcela amou-me durante quinze meses e onze contos de réis”.  Tudo bem que durante a narrativa em momento algum é citado que Marcela é prostituta. Mas ela é. Está subentendido. Machado utiliza a ironia e o eufemismo para que o leitor capte o significado. 



 Apaixonado por Marcela, Brás Cubas gasta enormes recursos da família com festas, presentes e toda sorte de frivolidades. Seu pai, para dar um basta à situação, toma a resolução mais comum para as classes ricas da época, manda o filho para a Europa estudar leis e garantir o título de bacharel. Brás Cubas, no entanto, segue contrariado para a universidade, sem nem ao menos um tchauzinho de Marcela. Em Coimbra, a vida não se altera muito. Com o diploma nas mãos e total inaptidão para o trabalho, Brás Cubas retorna ao Brasil e segue sua existência de verme parasita, gozando dos privilégios dos bem-nascidos do país. Tem seu segundo e mais duradouro amor, Virgília, parente de um ministro da corte, e aí nosso Brás via no casamento com ela um futuro político. No entanto, ela acaba se casando com Lobo Neves, que arrebata do protagonista não apenas a noiva, como também a candidatura a deputado que o pai preparava. A família dos Cubas, apesar de rica, não tinha tradição, pois construíra a fortuna com a fabricação de cubas e tachos e isso não era legal, bacana e limpinho no mundo das aparências sociais. Assim, a entrada na política era vista como maneira de ascensão social, uma espécie de título de nobreza que ainda faltava a eles. Lembrando que isso tudo é narrado do "além", porque Brás Cubas está morto. 

Meu querido Professor Linhares Filho falava que a morte de Brás na verdade era uma morte moral, que o personagem já vivenciava mesmo em vida. Mas refletindo sobre Brás Cubas, depois da enésima releitura, esse 'não lugar' que Brás Cubas ocuparia, essa isenção por estar morto, a completa objetividade por conta do distanciamento no além vida, não existe. Brás Cubas está todo o tempo em que narra sua vida, banhado em subjetividade, guiando a nossa leitura através de juízos de valor. O defunto parece mais um elemento cômico e irônico. Não estaria toda essa gente burguesa e vazia, de alguma forma, morta? Pois é.

A gente sempre aprende algo todos os dias, mesmo que não queira. Houve tempo, anos atrás, que eu achava que, naquela altura da minha vida, já sabia tudo, ou quase tudo, que haveria de saber sobre Memórias Póstumas de Brás Cubas. Ledo engano. Livros incríveis, como é o caso do Brás Cubas, sempre nos mostram algo novo toda vez que são relidos. E essa foi a minha mais nova reflexão sobre Memórias Póstumas de Brás Cubas.

Mais sobre Machado.

Inté.


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