sexta-feira, 17 de janeiro de 2020

Parasita



Estou numa fase da minha vida que não quero ser desafiada ou, no mínimo, procuro não ser. Até que consigo ficar bem longe das notícias e ficar me martirizando com a estupidez coletiva dessa época. Tento fugir de reler trechos de livros que me corroem as entranhas. Ficar bem longe do Ensaio sobre a cegueira, ou O Conto da Aia, Admirável mundo novo e a barata da GH. Mas daí, a barata da GH me parece muito mais o surto de uma dondoca asquerosa da zona sul carioca, porque aquela dondoca infeliz é a barata. Resquício de crítica social? Toneladas de crítica social? Eu tento.

 Aí a criatura humana começa o ano assistindo Frozen 2. Vai a uma sala da Cinépolis, a mais cara da cidade, compra o balde de pipoca do Olaf, já pra né, não se desafiar a nada, fora terminar o mês pobre. Só que sede à tentação de ir até os cinemas do Centro Cultural Dragão do Mar, pra assistir Parasita. Por que eu fui fazer isso?

Um filme muito arriscado pra pessoas que não querem ser desafiadas, como eu nesse momento. Vou passar dias sem conseguir dormir direito por causa do Bong Joon-Ho (já gostei dele no Golden Globe, sugerindo que o povo começasse a ler as legendas).

É uma espécie de sátira-terror, uma mistura muito comum que acontece nos filmes contemporâneos, um passeio por alguns gêneros sem se prender a nenhum, como Bacurau. É engraçado, faz a gente rir, há o humor, mas muito atropelado. Há também a tensão do drama. Aterroriza por conta da violência gráfica. E é uma melancolia na falta de certeza do que realmente foi o desfecho.

Vendo todo o seu realismo brutal, não consegui não lembrar de toda a legião de alunos fãs de KPop (não tem nada de Kpop no filme, é só um surto meu, que não sou dondoca, mas surto constantemente) e o tanto que KPop é errado e tudo o que tem por trás da sociedade sul-coreana, muito doente e pervertida, em busca de se americanizar e perder a própria cultura. Mas o pior mesmo, é a degradação a que são submetidos os pobres e miseráveis de um país que abraçou o modo mais aviltante do capitalismo. Decerto, é um filme muito contemporâneo e, desafiador, para o meu mal.

A família do filme (Kim), aninhada  num porão, o que sobra pra eles morarem, como uma família de ratos (parasitas), no estrato mais baixo da sociedade, consegue se embrenhar na família rica (Park), tentando sobreviver às custas dos ricos, que só são ricos porque são o topo de um sistema que não deixa quem está embaixo, subir. Quem é o parasita, né? Tá lá no Auto da Compadecida, "a esperteza é a arma do pobre." Só que nem a Compadecida, tampouco a família Kim esperava pelo pobre de direita adorador de quem o despreza.

Tem uma máxima popular que fala assim, que "todo castigo pra pobre é pouco." Eu vivo dizendo isso pra mim mesma. Dia desses falei isso, debaixo de uma chuva torrencial, carregando uma caixa de bolo, porque decidi vir a pé pra economizar o do táxi (pobre sinistra). Mas, são enredos como o de Parasita que me dizem que sim, mas também que o castigo quando vem pra rico, vem em tempo. 

Inté. Assistam Parasita.

Imagem: Não se enganem com a imagem.

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